Constatou-se uma menor atividade cerebral durante a psicografia,
aliada à geração de complexo conteúdo escrito
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São Paulo - Uma pesquisa
mundial envolvendo neuroimagem
analisou o fluxo sanguíneo cerebral de médiuns brasileiros durante a prática da
psicografia (em que “um espírito escreve através da mão do médium”). O estudo
revelou resultados intrigantes quanto a menor atividade cerebral durante o
estado dissociativo mediúnico e concomitante geração de complexos.
O trabalho foi realizado por pesquisadores do Instituto de
Psiquiatria (IPq) do Hospital das Clínicas (HC) da Faculdade de Medicina da USP
(FMUSP), da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), em Minas Gerais, da
Universidade da Pensilvânia e da Universidade Thomas Jefferson, ambas nos
Estados Unidos.
A pesquisa Neuroimagem durante o estado de transe: uma
contribuição ao estudo da dissociação, foi publicada no dia 16 de novembro na
PLOS ONE, renomado periódico científico de acesso público gratuito. O artigo
está disponível neste link. O estudo envolveu dez médiuns brasileiros com 15 a
47 anos de experiência mediúnica e aproximadamente 18 psicografias por mês,
destros e com plena saúde mental.
Os participantes receberam um marcador radioativo para captar a
atividade cerebral durante a escrita normal e durante a prática da psicografia
em estado de transe. Os médiuns foram escaneados usando SPECT (tomografia
computadorizada com emissão de fóton único) para destacar as áreas do cérebro
que são ativas e inativas durante as respectivas tarefas.
Os pesquisadores observaram que, durante a psicografia, os médiuns
experientes apresentaram níveis mais baixos de atividade nas áreas do cérebro
associadas ao planejamento, raciocínio, geração de linguagem e solução de
problemas (hipocampo esquerdo/sistema límbico, giro temporal superior direito e
as regiões do lobo frontal do cingulado anterior esquerdo e giro direito
precentral) em relação a escrita normal (sem transe mediúnico).
Os autores consideram que as áreas hipo-ativadas possivelmente refletiram
a ausência de consciência durante a psicografia. Os médiuns menos experientes
mostraram o oposto: aumento do fluxo sanguíneo cerebral nas mesmas áreas
cerebrais durante a psicografia em comparação à escrita normal. A diferença foi
significativa em comparação com os psicógrafos experientes. Este achado pode
estar relacionado com a tentativa mais esforçada dos menos experientes na
prática da psicografia. As amostras
de escrita produzidas foram analisadas e verificou-se que os textos
psicografados foram mais complexos que os conteúdos produzidos no estado normal
de vigília. Os conteúdos gerados durante as psicografias envolveram princípios
éticos e espirituais e a importância da união entre ciência e espiritualidade.
Em particular, os médiuns mais experientes apresentaram escores
significativamente mais elevados de complexidade, o que normalmente exigiria
mais atividade nos lobos frontais e temporais, e este não foi o caso. As áreas
relacionadas ao planejamento mostraram menor atividade.
Expressão
literária mediúnica
Várias hipóteses foram consideradas, uma delas é que como a
atividade do lobo frontal diminui, as áreas do cérebro relacionadas à
criatividade estão mais desinibidas (o que ocorre com o uso de álcool ou de
drogas). De uma maneira semelhante, o desempenho da meditação e da improvisação
musical estão associados com níveis mais baixos de atividade cerebral, que pode
favorecer o relaxamento e a criatividade respectivamente.
Porém, é importante notar que o consumo de álcool ou drogas, a
meditação e a improvisação musical são estados bastante peculiares e distintos
da psicografia. Portanto, não comparáveis diretamente com a expressão literária
mediúnica. Os médiuns referem que “a autoria dos textos psicografados foi dos
espíritos comunicantes e não pode ser atribuída a seus próprios cérebros” sendo
assim esta hipótese plausível.
Segundo o primeiro autor do estudo, o psicólogo clínico e
pesquisador do Programa Saúde, Espiritualidade e Religiosidade do IPq, Julio
Peres, embora o motivo exato dos presentes resultados não seja conclusivo neste
momento, esta primeira avaliação neurocientífica fornece dados interessantes
sobre estados dissociativos mediúnicos alinhados a compreensão da mente e sua
relação com o cérebro, e estes achados merecem futuras investigações, tanto em
termos de replicação e hipóteses explicativas. Peres é doutor em Neurociências
e Comportamento pelo Instituto de Psicologia (IP) da USP.
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