Por Rosana Braga
Sim, me rendi à trilogia "50
tons"*! E embora ainda não tenha lido o último volume, já poderia refletir
aqui sobre os tantos e tantos temas levantados na narrativa que conta sobre o
encontro e a relação entre um jovem casal - Ana e Christian. Porém, quero me
deter, neste momento, a apenas um!
Não se trata da combinação entre
dominador e submissa, nem do erotismo tão explorado entre cada intenso
acontecimento. E também não quero defender nenhuma das tantas diferentes
opiniões que já ouvi e li acerca deste que é - indiscutivelmente - um grande
sucesso editorial!
Quero falar de um detalhe que
muito me envolveu e cativou! É sobre a capacidade que o protagonista - Christian
Grey - tem de expor a sua verdade. De se colocar. De falar exatamente o que
quer, como quer, onde quer e quando quer.
Em princípio, colocado desta
forma, e especialmente a quem não leu, pode parecer uma característica egoísta.
Mas definitivamente não é! A começar por um contrato que ele aceita discutir,
passando pela clareza de suas colocações e, sobretudo, pela coerência que ele
mantém, o tempo todo, entre o que fala e faz. Fiquei realmente admirada.
Pra quem já me lê, sabe que uma
das sugestões que insisto em repetir quando falo de relacionamento é sobre a
comunicação. Clareza, objetividade, transparência. Acredito, realmente, que a
prática recorrente dessas qualidades facilitaria de modo imensurável e
inenarrável nossa vida, nossa saúde e nossas relações, especialmente as
afetivas.
De repente, pensei: "Que
maravilha! Ele pede e pratica pelo menos 50 tons da verdade!". E por ser
assim, termina incentivando Ana a esse treino. Não exige "sim" ou
"não", porque mais importante do que as determinações é o que pode
ser vivido. Enquanto casal, parceiros, adultos e conscientes, eles discutem,
perguntam, ouvem um ao outro. Quando ainda não sabem, dão-se espaço e tempo
para pensar. Quando sentem que algo pode lhes ser demais, comprometem-se a,
pelo menos, tentar.
Sem garantias, sem certezas. Um
dia de cada vez. Um cômodo de cada vez. Um acessório de cada vez. E pra
melhorar, ainda têm as palavras de segurança! "Amarelo" e
"Vermelho"! A primeira serve de alerta para quando um está se
aproximando do limite do outro. E a segunda, refere-se ao alerta de que um
chegou ao máximo do que o outro pode suportar.
Quem de nós tem coragem de
avisar? Quem de nós pergunta ao outro qual é o seu limite? Quem de nós pede ao
parceiro para gritar "pare" quando não aguentar mais uma situação e,
de forma respeitosa, mantendo as alteridades rigorosamente intactas, para
imediatamente? Sem discutir. Sem barganhar. Sem tentar impor as próprias
necessidades!
Não estou aqui discutindo os
termos ou as cláusulas do contrato formal e por escrito que ele propôs a ela,
mas sobretudo do contrato verbal, das intermináveis conversas, da abertura
total e irrestrita para falar, perguntar, refletir, esgotar as dúvidas, os
medos e as inseguranças. Isso é que é incrível, arrebatador, encantador!
Quem não quer conviver com alguém
que está disposto a falar do que sente, que está comprometido até o último fio
de cabelo com a sua verdade? Penso que não é o sexo ou o dinheiro ou a beleza
do personagem que conquistou o mundo. Sim, claro, tudo isso tem seu valor e,
apesar de serem questões absolutamente relativas, realmente não vejo nada de
mau em querer o belo, o bom e o prazeroso. Mas penso que o que sustenta tudo
isso na narrativa são os inúmeros tons da verdade usados tão contundentemente
na relação entre eles.
Quantas vezes temos medo de nós
mesmos, da nossa história, do nosso passado, de nossos pensamentos e
sentimentos, de nossas fraquezas? E por tudo isso, inventamos alguém que não
somos para tentar obter alguma garantia de que podemos ser amados pelo outro? E
sabe o que conseguimos? Enganos, ilusões e frustrações! Amores de mentira!
Relações pequenas, cheias de silêncios ensurdecedores, abismos e
mal-entendidos!
O que me abraçou definitivamente
na trilogia de E. L. James, a autora britânica deste best-seller, foi a coragem
de seu personagem de não se esquivar de si mesmo. De enfrentar seus próprios
demônios como consegue, quando pode, pedindo ajuda ao seu psiquiatra, aceitando
ajuda de onde veio, sem julgar, sem desmerecer.
Porque, acredito eu, foi a
sequência de suas escolhas - nem certas e nem erradas, apenas as escolhas
possíveis em cada momento de sua vida - que lhe possibilitou chegar ao encontro
de seu grande amor. Ao encontro da mulher através de quem ele pode enxergar sua
própria alma. E o que é o amor senão ser para o outro um espelho fiel de tudo
de bom e tudo de nem tão bom que existe nele e, ainda assim, continuarem
juntos?
No mais, o exercício é de
evolução diária, consistente e com o máximo de prazer que for possível! Lancem
mão de seus acessórios pessoais e façam-se pulsantes e satisfeitos!
* De E. L. James, a trilogia foi
traduzida e publicada no Brasil sob os títulos "50 tons de cinza",
"50 tons mais escuros" e "50 tons de liberdade".
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